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Análise: redução de salário de servidores é prejudicial, agressiva e ineficaz

Medidas que almejam corte de salários do funcionalismo público são puro populismo e retórica

Publicado: 09 Abril, 2020 - 10h32

Escrito por: LBS Advogados

Reprodução da Internet
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Apresentamos a seguir as considerações da LBS Advogados, que presta assessoria jurídica para a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam), sobre as propostas do Governo Federal e do Congresso Nacional de redução de salários de servidores públicos.

De acordo com os advogados, a economia realizada sobre a folha de pagamento não chegaria nem a 5% do montante do orçamento que precisará ser empenhado. Sendo assim, mais uma vez o servidor seria atacado por uma alternativa prejudicial, agressiva e ineficaz, pois o confisco de salário nos moldes propostos é irrisório aos valores que deverão ser injetados no país, enquanto, em contrapartida, o salário do servidor é extremamente importante para movimentação em diversos outros seguimentos de consumo.

O que está em discussão?

Desde novembro do ano passado, o Congresso Nacional, seja através de propostas do Executivo ou do Legislativo, pauta a redução de salários servidores públicos e outras despesas com o funcionalismo.

Pelo menos três Propostas de Emenda à Constituição (PECs) 186 (Emergencial), 187 (da Desvinculação dos Fundos) e 188 (do Pacto Federativo) versam sobre o assunto. Os instrumentos compunham as sugestões do Ministro da Economia, que, em limitada síntese, buscava a redução do gasto público. Inclusive, na chamada PEC Emergencial, o objetivo primordial é reduzir proporcionalmente os salários e a carga horária dos servidores públicos por dois anos, em 25%, além de impedir promoção e vedar a realização de concurso público, impondo limite para a aplicação das medidas menor que a do teto do gasto, disposto no art. 109 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Mas há uma nova proposta para a redução dos salários, que decorre do Projeto de Lei do Deputado Federal Carlos Sampaio (PL nº 1.144), de Campinas, filiado ao PSDB, que destacamos em tópicos para facilitar a compreensão.

PL Nº 1.144

Quais servidores serão afetados? 

- Ocupantes de cargos, funções e empregos públicos que estão na ativa; 

- Da Administração Direta, Autárquica e Fundacional, portanto, não se aplica aos empregados de Empresas Públicas;

- Dos Poderes da União - Executivo, Legislativo e Judiciário. Não se aplica aos servidores estaduais nem municipais;

- Detentores de mandato eletivo e demais agentes políticos no âmbito federal;

Não se aplica aos servidores da saúde e de segurança pública que estejam prestando serviço efetivo durante o estado de calamidade pública.

Como serão afetados?

- Redução do salário em 10%, para quem recebe remuneração superior a cinco mil reais, aplicado o percentual para quem recebe até R$ 10.000,00;  

- Redução do salário em no mínimo 20% até 50%, para quem recebe subsídio superior a dez mil reais. Esse percentual será definido por cada Poder.

Qual o prazo da medida?

Aplica-se após aprovação, por 3 meses, prorrogável por 3 meses, limitada a aplicação ao prazo de duração do estado de calamidade pública.

O que será feito com o dinheiro retirado dos salários dos servidores?

Será direcionado ao Ministério da Saúde, para utilização em ações e serviços públicos de saúde relacionados ao combate à pandemia internacional ocasionada pela infeção humana pelo Coronavírus (Covid-19).

Análise

A LBS acredita que o projeto de lei de Carlos Sampaio cumpre basicamente uma sanha populista que se funda na retórica de que se os trabalhadores informais ou da iniciativa privada poderão ter decréscimo salarial, em decorrência da pandemia, o servidor público também deverá ter.

Vários economistas apontam que não é hora de ajuste fiscal. É preciso que o Estado gaste dinheiro para amenizar as consequências econômicas.

O que se percebe, na realidade, é que a ideia de reduzir a remuneração dos servidores públicos é uma constante política, conforme lembrado no início do texto. Não é algo que surgiu agora, como uma solução orçamentária para pandemia ou mesmo por solidariedade como alguns propagam.

Até porque, se o espírito caridoso e de proporcionalidade fosse aplicado, certamente a redução se daria de forma progressiva. Da forma como proposta, entretanto, o critério utilizado padece de razoabilidade já que enquanto um Poder poderá aplicar 20% de redução, o outro poderá aplicar até 50%, sem que haja qualquer justificativa para tanto.

Esquecem-se, ainda, de que a estabilidade funcional, além de assegurar inferências de agentes políticos para manutenção do interesse público, deve ser, também, uma garantia ao servidor que foi aprovado em concurso público e dedica sua carreira ao múnus público por um salário e progressão funcional dispostos em lei, com uma série de restrições quanto ao exercício de outra atividade.

Além disso, a medida não prevê redução da carga horária. No atual cenário, alguns servidores estão há anos sem reposição salarial, têm trabalhado além das horas habituais e, ainda, terão um decréscimo salarial considerável, gerando enriquecimento sem causa do Estado e exploração da mão de obra.

O projeto fala menos que deveria. Exime apenas servidores da saúde e da segurança que estejam atuando diretamente no combate ao Covid-19, mas mantem a redução da remuneração de outras categorias, que igualmente têm trabalhado incessantemente contra a pandemia.

Observa-se, por exemplo, os oficiais de justiça, no Judiciário, os servidores da ANVISA, que têm trabalhado diuturnamente em procedimentos administrativos e de fiscalização, além das universidades públicas, onde muitos profissionais estão trabalhando nos laboratórios. 

Além da proteção constitucional do direito adquirido e da irredutibilidade de vencimentos (inciso XXXVI do artigo 5º e inciso XV do art. 37 da Constituição), a maioria dos Ministros do Supremo Tribunal Federal se manifestaram pela inconstitucionalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal (ADI nº 2.238 - julgamento em curso), que permitia a redução dos vencimentos com a redução proporcional da jornada, de modo que eventual lei infraconstitucional, mesmo que durante um período excepcional, deverá seguir o mesmo caminho, já que não há permissivo para inaplicabilidade da constituição em um momento de calamidade pública. Apenas um esforço hercúleo de interpretação poderia considerar tal lei constitucional ou um estado de exceção.

Deputados avaliam também a possibilidade de aprovação da PEC Emergencial ou outra com mesmo conteúdo, embora precise de maior quórum para aprovação. Acredita-se que juridicamente seria o melhor caminho, mas ainda entrariam em confronto com direito adquirido e irredutibilidade de vencimentos.

Há, ainda, crítica econômica, pois outras medidas mais significativas poderiam ser adotadas para aumentar o orçamento público, já que o corte de salários dos servidores retira dinheiro da base reduzindo ainda mais circulação de dinheiro na economia.

Se não pela lógica, não há outra justificativa para a manutenção da medida que não seja perseguição ideológica, ao contrário do desmonte dos serviços públicos, observada até aqui. A mudança dos paradigmas tem nos mostrado que apenas um Estado robusto e eficiente consegue deter grande crise e fazer frente às adversidades. Por isso, é momento de enaltecer e buscar saídas por meio do Estado, composto por seus servidores, e não minguar suas capacidades.

 

Edição de conteúdo originalmente produzido pela LBS Advogados